O governo decidiu ceder aos pedidos dos empresários e vai elevar a sua exposição ao risco para garantir a construção do trem de alta velocidade. A Empresa de Planejamento e Logística (EPL), que será o braço estatal dentro do consórcio do trem-bala, terá uma participação de 45% no empreendimento, bem acima do índice de 33% que havia planejado inicialmente.
Durante toda a etapa de audiências públicas do trem-bala, realizadas em agosto e setembro, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) resistiu em ceder ao pleito das empresas e manteve a decisão de que a EPL só teria um terço do negócio. Na quarta-feira, poucas horas antes de fechar o texto definitivo do edital, o governo decidiu colocar mais fichas no empreendimento.
A decisão tem impacto direto no aporte financeiro que, de fato, será aplicado pelo sócio privado que vencer o leilão de operação do trem, que está marcado para setembro de 2013. Pelos cálculos do governo, serão injetados R$ 7,671 bilhões pelo consórcio que vencer o leilão. Pelas regras do edital, R$ 70% desse montante – R$ 5,37 bilhões – poderá ser sacado dos cofres do BNDES, por meio de um financiamento que será pago durante os 40 anos da concessão do trem-bala. Sobram, portanto, R$ 2,3 bilhões a serem aplicados diretamente pelos sócios. Com participação de 45%, a EPL garantirá R$ 1,035 bilhão desse aporte. Isso significa que, para ser dono de 55% do trem-bala, um empreendimento que custará, no mínimo, R$ 35 bilhões, o sócio privado fica com o compromisso de desembolsar R$ 1,265 bilhão.
O negócio poderá ficar ainda mais atraente para o setor privado, se o governo assumir, por conta própria, a construção da infraestrutura do trem-bala, o que poderá ocorrer na segunda etapa do projeto. Neste primeiro leilão, o governo está contratando a empresa que será fornecedora dos equipamentos e da tecnologia do trem, assumindo a operação do projeto. Em 2014, ocorrerá a contratação da etapa mais cara do projeto: os serviços de construção civil. Até agora, o governo planejava fazer um segundo leilão para conceder as obras a um grupo de empreiteiras, as quais seriam remuneradas pela operação comercial do trem.
Ontem, em entrevista coletiva, o presidente da EPL, Bernardo Figueiredo, disse que o modelo para a segunda etapa ainda não está fechado, mas que o governo avalia a possibilidade de fazer uma contratação direta dos serviços, por meio de uma licitação. Em termos práticos, isso significa que as construtoras não seriam mais sócias do trem-bala, mas apenas prestadora de serviços. Se esse for o caminho escolhido, o governo terá cedido naquela que era a principal demanda das construtoras, que desde o início do projeto pediam para que executassem as obras e recebessem por isso, sem participação acionária no empreendimento.
Para o governo, a conta fecha. Com as receitas de funcionamento do trem, a União pagaria as construtoras e ainda remuneraria o consórcio operador, no qual é sócia minoritária, mas com poder de veto sobre qualquer decisão relacionada ao TAV. “Estamos avaliando, nada está fechado sobre isso ainda”, disse Figueiredo.
O edital do trem-bala, publicado ontem pela ANTT, traz mudanças quanto à inauguração do projeto. Até então, o governo defendia que trechos dos 511 km que ligam Rio até Campinas poderiam entrar em operação se estivessem concluídos. A expectativa era ter algo em funcionamento já em 2016. Essa possibilidade foi descartada. Segundo Figueiredo, o trem-bala só entrará em operação comercial quando 100% do empreendimento estiver pronto. “Nossa expectativa é ter tudo pronto em 2018″, comentou, acrescentando que o prazo previsto no edital é junho de 2019, cronograma que admite ainda mais um ano de atraso.
As alterações no edital incluíram ainda o aumento do preço mínimo de outorga, que saltou de R$ 66,12 por km rodado por trem para R$ 70,31. O preço de outorga funciona como um tipo de pedágio que a concessionária do trem-bala pagará para rodar seus trens sobre os trilhos. A garantia de proposta que deverá ser feita pelos consórcios também foi alterada de R$ 75 milhões para R$ 77 milhões.
Fonte: Valor Econômico, Por André Borges
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