Eduardo Vasconcellos, diretor do Instituto Movimento, aponta problemas de método e faz uma análise crítica de pesquisa divulgada recentemente pela FGV
Fonte: Mobilize Brasil
“Não há nenhum estudo detalhado que traga, em valores atualizados, o custo do congestionamento por ano na cidade de São Paulo”, diz Eduardo Alcântara Vasconcellos, diretor do Instituto Movimento.
Segundo o especialista em transportes, o último estudo disponível é de 1998, realizado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e pela ANTP, mas que precisaria ser revisto e atualizado antes de ser usado novamente.
Vasconcellos estima que, embora o congestionamento seja grave e cause muitos prejuízos, o valor apontado na pesquisa divulgada há cerca de duas semanas pela FGV resulta de metodologia equivocada e acaba servindo para justificar investimentos inúteis de apoio ao uso do automóvel, além de ignorar o transporte público. “Precisamos de valores corretos para divulgar para a sociedade e para orientar investimentos eficazes no sistema de mobilidade”, afirma o engenheiro e sociólogo.
Para fundamentar sua crítica ao estudo da FGV, o especialista explica que há duas metodologias internacionalmente aceitas para o cálculo do tempo perdido no trânsito - uma que vem da área da engenharia e outra da economia de transportes. Ambas trazem divergências conceituais, que costumam se refletir nos resultados finais do cálculo, mas nunca de modo muito significativo, diz ele.
Na sua opinião, o trabalho da FGV adotou uma metodologia heterodoxa: “A criatividade é válida e necessária no meio acadêmico, mas quando for feita com rigor e trouxer contribuições reais, o que não é o caso deste estudo”.
Eduardo Vasconcellos, do Instituto Movimento
Por exemplo, o principal custo calculado em função do congestionamento é o tempo parado e sua relação com a renda das pessoas. Em geral, os estudos chegam a um custo de congestionamento de 1% ou 3% do PIB da cidade estudada. Mas nada que se aproxime dos valores apontados pelo estudo da FGV, espanta-se Vasconcellos.
Também o índice adotado no estudo da FGV, de “3 pessoas por carro”, diverge do aceito no Brasil, que é de 1,4 pessoa/carro; em São Paulo, estaria se aproximando de 1,2, adianta. Ou seja, o estudo dobra o custo do tempo perdido ao usar um parâmetro errado.
Espaço entre um carro e outro
Outro problema refere-se ao cálculo do congestionamento com base nos quilômetros de trânsito parado, com base em informações da CET. Neste caso, diz Vasconcellos, a falha foi não considerar o espaço necessário entre um carro e outro: “É como se a fila tivesse um carro (5 metros de comprimento) colado no outro, o que não permitiria o desmanche do congestionamento. Vendo assim, o estudo inflacionou muito o número de automóveis dentro do congestionamento”.
Ao ‘inflacionar’ o número de carros, aumentou também o valor calculado para o congestionamento. Isto aconteceu com outros parâmetros do estudo e os parâmetros e os valores estimados forem sendo corrigidos, no final, mesmo considerando a metodologia adotada pelo estudo, chega-se a um valor muito menor do que o anunciado, alerta Vasconcellos.
Se não há como afirmar, pode-se ao menos fazer uma estimativa: segundo Vasconcellos, os dois métodos tradicionais de cálculo adotados internacionalmente permitem estimar que o custo do congestionamento paulistano está hoje entre 7 e 8 bilhões de reais/ano, sendo a maior parte paga por quem usa ônibus. Esta é, em si, uma quantia enorme e que requer uma reflexão urgente sobre o que fazer.
O valor de 40 bilhões a que chegou um estudo da FGV não se justifica e acaba por servir de argumento para propor investimentos bilionários naquilo que não deve ser feito.
Segundo o especialista, a projeção exagerada vem ao lado de propostas questionáveis de infraestrutura, que sugerem o direcionamento de recursos públicos para mais túneis, viadutos e pontes, ou seja, mais um grande projeto para apoiar o uso do automóvel.
Ele enfatiza que o estudo da FGV não ajuda na busca de soluções sustentáveis. “Ignora o transporte público e não motorizado e só enxerga o carro, propondo soluções comprovadamente inúteis, com grandes impactos negativos sociais e ambientais, como fartamente demonstrado no mundo e na própria cidade de São Paulo”.
A solução? “Investir em estudos que gerem soluções capazes de reduzir o uso excessivo do automóvel. E melhorar muito a qualidade e oferta do transporte público”, reitera.
Soluções imediatas e sustentáveis? “De novo; são duas: ampliar a oferta do transporte público integrado de ônibus, trem e metrô. O ônibus deve circular entre 20 e 24 km por hora e os corredores de ônibus devem se aproximar da regularidade do metrô e do trem. Devemos organizar sistemas adequados de mobilidade a pé e de bicicleta. E restringir o uso inadequado e excessivo do automóvel.
Nenhum comentário:
Postar um comentário