Muitos já se acostumaram com o termo ciclável para falar das cidades que se pode andar de bicicleta, como Nova York, Bogotá e até mesmo o Rio. Ouvimos com frequência que o Rio é muito mais ciclável que São Paulo. Mas você já ouviu alguém falar sobre cidades caminháveis?
Faz um pouco mais de um ano conheci o termo walkability, que em português comecei a chamar de caminhabilidade, e foi amor a primeira lida. Desde então tronou-se um dos grandes princípios que me move: promover uma São Paulo mais caminhável.
Bom, antes de tudo devo explicar o que é Caminhabilidade, em uma tradução livre do site da Jane’s Walk, que disponibilizo na íntegra no site www.caminhabilidade.org :
“A Caminhabilidade (Walkability) é uma medida quantitativa e qualitativa para medir o quão convidativa ou não-convidativa uma área pode ser para as pessoas, pedestres.
O caminhar interessa cada vez mais para as cidades, na proporção em que a conexão entre pessoas se deslocando a pé e bairros socialmente vibrantes está se tornando cada vez mais clara. Ambientes construídos que promovam e facilitem o deslocamento pé – às lojas, trabalho, escola, equipamentos e serviços – são melhores lugares para se viver, promovem estilos de vida mais saudáveis e têm níveis mais elevados de coesão social.”
Então a caminhabilidade é um método para medir o nível de um lugar em ser capaz de propiciar um ambiente adequado para que os deslocamentos a pé, sendo estes agradáveis e seguros para quem se desloca. Pode-se falar em caminhabilidade em proporção rua, bairro, cidade e até mesmo caminho específico.
Bom, aí a primeira coisa que vocês vão pensar com certeza é: “Nossas calçadas são um horror, não somos NADA caminháveis”. E elas são realmente um horror, como o próprio Mobilize pôde constatar no levantamento Calçadas do Brasil feito em 2012, que tinha como critério as condições das calçadas:
- - Irregularidades no piso
- - Largura mínima de 1,20 m, conforme norma ABNT
- - Degraus que dificultam a circulação
- - Outros obstáculos, como postes, telefones públicos, lixeiras, bancas de ambulantes e de jornais, entulhos etc.
- - Existência de rampas de acessibilidade
- - Iluminação adequada da calçada
- - Sinalização para pedestres
- - Paisagismo para proteção e conforto
Porém a caminhabilidade considera dois níveis de critérios: os objetivos, que são as condições físicas das calçadas e do espaço, e os subjetivos, que se remetem as sensações enquanto caminha, ou seja se sentiu-se seguro, feliz, tranquilo entre outras sensações enquanto caminhava.
No sábado passado, dia 9 de novembro, a pedido da Fundação Janes Walk do Canadá, que tem esse nome em homenagem à Jane Jacobs – famosa urbanista por prezar e defender que as pessoas nas ruas são a essência da cidade e cujo uma das frases mais famosas diz: “Cities have the capability of providing something for everybody, only because, and only when, they are created by everybody.” (Tradução livre: As cidades são capazes de oferecer alguma coisa para todos, sempre e quando, elas são criadas por todos”)- organizei junto com o Instituto Mobilidade Verde e o Conexão Cultural um passeio pela Vila Madalena para observar e discutir caminhabilidade.
O caminho foi muito bem planejado previamente para que passássemos por locais com muito verde, lugares com boas estruturas mas abandonados, por becos de arte urbana movimentados, por ruas em que não se tem espaço para passar na calçada de tanta gente, por praças com iniciativas cidadãs, entre outros lugares. E foi pedido em todo o caminho que os participantes tirassem fotos com moldura verde do que gostaram e com moldura vermelha o que reprovavam, como se pode ver:
Mas não importa que tipo de lugar passávamos em todo o trajeto uma característica geral podia ser constatada: as calçadas foram esquecidas, ou porque tinha buracos, ou degraus, ou até mesmo exagero de plantas, mas aquelas calçadas jamais tinham sido pensadas nas pessoas. Se isso incomodou muito as pessoas? Com certeza, mas muito provavelmente incomodou mais porque pedimos para elas que elas observassem esses problemas.
No final as pessoas tinham que responder um checklist sobre a caminhada que perguntava sobre: espaço para caminhar, facilidade de atravessar as ruas, comportamento dos motoristas, facilidade em seguir as regras de segurança e por fim sobre o prazer em caminhar. E pasmem apesar de todos os problemas estruturais que constatamos ao longo do caminho no quesito prazer o passeio recebeu 8,2 como nota.
O que isso quer dizer? Primeiramente que mesmo um local sendo super inacessível e irregular ele pode ser muito prazeroso para passar e estar (e que somos seres muito contraditórios, pois sabe quando você se apaixona por alguém mas racionalmente não entende o porque, afinal a pessoa tem várias características que te incomodam? Pois é, também podemos sentir isso com relação as ruas e cidades). Em outras palavras este bairro tem todas as características subjetivas de um local caminhável. Até pode-se dizer que a Vila Madalena já está meio caminho andado para ser muito caminhável, e talvez a metade mais difícil, pois são as características de vivacidade do bairro e de atratividade.
Porém já nos quesitos que tratavam puramente das questões objetivas (1 e 2) podemos constatar que a média da nota é 5,5. Péssimo? Sim, mas para mim esse resultado é para se comemorar.
Comemorar? Isso mesmo, pois os problemas constatados são puramente estruturais, alargar calçadas, tapas buracos, implementar rampas de acesso, ter um local destinado a lixo, fiscalizar o uso das calçadas pelos bares, ou seja, tem soluções práticas.
Ao mesmo tempo em que todos respondiam esse checklist estávamos sentados na grama na Praça das Corujas discutindo sensações e sugestões para a cidade (qual foi a última vez que você fez isso, ou você JÁ fez alguma vez isso?), e dessa conversa saíram insights e discussões que merecerem reflexões e textos mais profundos, que lanço aqui para deixar você também pensando:
- - Se o poder público que cuida e se responsabiliza pela vias dos carros (via carroçável) porque não cuida da via das pessoas (calçada)?
- - Ou ao contrário, como seriam as vias carroçáveis caso os proprietários fossem responsáveis pelo trecho em frente a suas casas?
- - Se queremos vida nas ruas é bom o ruim os bares tão cheios que chegam a ocupar as calçadas?
- - Ou as pessoas paradas no meio das calçadas é positivo ou negativo?
- - O que faz uma praça cheia de equipamentos como parquinho, quadra, mesas estar desocupada e outra com menos equipamento estar ocupada?
- - Onde deveriam ter bancos públicos na cidade?
Enquanto pensamos em todas essas questões vamos colocar em prática soluções junto com o poder público e tornar nossa cidade um lugar mais vivo, mais humano, mais CAMINHÁVEL?
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