A morte do aposentado Florisvaldo Carvalho da Rocha por atropelamento causado por um ciclista está sendo a deixa para uma gritaria histérica e indignada.
Por conta da morte? Não, antes fosse. A indignação é pela tal “falta de panejamento” das ciclovias. Mas obviamente é muito mais. É uma transferência do embate político atual para o tema mobilidade.
“Foi o PT/Fernando Haddad que fez? Então sou contra”, esse é o espírito.
Há que se lamentar, e muito, a morte de quem quer que seja e há que se desejar, e muito, que esses números entrem em declínio. Vamos gritar mesmo contra a ocorrência de uma morte, mas porque só contra o acidente envolvendo a bicicleta?
Por que todo o auê pelo caso? E em relação aos ciclistas mortos por atropelamento, nada a declarar? No domingo, o menino Thiago Pimentel de 9 anos foi atropelado e morto em ciclovia por um micro-ônibus. Nenhuma linha sobre isso, nenhuma gritaria?
Em 2014 nada menos que 47 ciclistas morreram atropelados segundo o Relatório de Acidentes Fatais da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Isso dá uma média de quase um por semana.
Quantos atropelamentos de pedestres os carros proporcionam? No ano de 2012 foram 12.300 vítimas fatais, ou seja, mais de mil por mês. Onde as pessoas gritaram por isso que eu não tinha ouvido?
O trânsito no Brasil faz mais vítimas que muitos países em situação de guerra. Em 2014 foram 52.200 mortes pelos dados do DPVAT que contabiliza ainda 596.000 indenizações por por invalidez. Mas criminosa parece ser apenas a “falta de planejamento das ciclovias” a ponto do Ministério Público querer interrompê-las. Tenha dó.
Parece estar evidente que a ciclovia sob o Minhocão é um equívoco. Suas pilastras criam pontos cegos que propiciam acidentes e estreitaram demais a área para pedestres. No entanto isso leva a um outro raciocínio: as ciclofaixas não deveriam existir!!
Não é o que o leitor está pensando. Claro que não sou contrário ao uso das bicicletas. É porque, no mundo ideal, não deveria ser necessária a marcação e muito menos que fosse sobre as calçadas. As bicicletas devem transitar na rua. A rua não é dos carros!!!
Estes precisam aprender a respeitar isso. E sob esse ponto de vista, o limite de 50 km/h hora ainda é muito. Deveria-se pensar rapidamente, em função da grande adesão ao uso das bicicletas, em adotar o limite de 32 km/h como é em Londres, por exemplo. Uma velocidade mais compatível com este outro tipo de veículo existente e com pleno direito de transitar chamado bicicleta.
O mais entristecedor é constatar que boa parte dessa gritaria venha também de pessoas que viajam para países “avançados” e acham tudo lindo e maravilhoso mas quando estão por estas bandas não desejam que nada mude porque não querem que haja equidade. Não se sentem iguais, acreditam-se superiores e querem entrar em suas máquinas blindadas e sair solapando, atropelando, desrespeitando e matando.
São pessoas que associam bicicleta a um brinquedo e fazer uso dela significa passear. Não alcançam que existam pessoas que não têm carro e que a bicicleta é seu meio de transporte.
O ciclista Gilmar Alencar, 45 anos, envolvido no agora tão falado acidente que culminou na morte do aposentado Florisvaldo Carvalho da Rocha, não estava passeando, estava indo trabalhar. Assim como David Santos, ciclista que teve um braço arrancado ao ser atropelado na avenida Paulista no dia 10 de março de 2013. Era madrugada de um domingo e David estava indo (!) trabalhar.
Encontrou pela frente um motorista bêbado que voltava da balada. Está aí o abismo entre estes mundos. Aqui são os donos do pedaço e não será uma faixa vermelha que irá impedí-los. “O Fernando Haddad apoia as bicicletas? Então vamos passar por cima”. Esta é a postura. Entristecedor é o mínimo que se pode dizer.
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