Do viatrolebus
por Renato Lobo
O Ex-prefeito de Bogotá, o economista Enrique Peñalosa, 59, concedeu entrevista para o jornal “Folha de São Paulo“. O ex-prefeito é conhecido mundialmente por ter conseguido dar jeito no caos do trânsito da cidade. Então vale a pena ler trechos desta entrevista:
O prefeito de SP acelerou a implementação de faixas exclusivas para ônibus, mas há críticas à falta de ajuste das linhas e às interferências de carros. O que acha?
Enrique Peñalosa – Não posso entrar nos detalhes técnicos de São Paulo, pode haver erros na implementação técnica, mas admiro o prefeito por dar importância aos corredores de ônibus. O mais importante em uma discussão é a estratégia. Pode haver erros na tática, mas não na estratégia. A dificuldade para solucionar o problema do transporte não é técnica nem econômica.
Podem fazer mais duas ou três linhas de metrô, e não vai consertar o trânsito, pode-se fazer mais vias, e não vai consertar. Os ônibus com faixa exclusiva e os metrôs podem consertar o problema da mobilidade, mas não dão jeito no trânsito. A única maneira de dar um jeito no trânsito é com restrições ao uso dos carros. E a restrição mais óbvia de todos é a de estacionamento. Em São Paulo ainda há muitas ruas em que os carros podem estacionar.
Com metrô ou sem metrô, nunca será possível resolver o tema da mobilidade sem um bom sistema de ônibus.
A prefeitura deve revisar ou não a decisão de permitir que táxis com passageiros utilizem os corredores e faixas?
Não se deve permitir os táxis. Pode ser que em algumas situações isso não seja um problema, e teriam de ser estudados os detalhes técnicos, mas, a princípio, nada que provoque a mais mínima demora aos ônibus deve ser permitido. Um táxi leva uma pessoa, e um ônibus pode levar até cem passageiros: o segundo tem direito a cem vezes mais espaço.
Além do mais, em sociedades tão desiguais como as nossas, se damos privilégios aos táxis terminaremos com um sistema onde os ricos têm um táxi com contrato permanente, ou quase permanente.
O sr. é defensor da expansão do uso da bicicleta. Por que é mais que uma causa de classe média ou de fim de semana?
O transporte é diferente de todos os demais desafios que temos na nossa sociedade. Diferentemente da saúde ou da educação, tende a piorar à medida que nos tornamos mais ricos. Se amanhã São Paulo exibir o dobro da renda per capita atual, haverá melhora nesses itens, mas o transporte vai ser pior, a não ser que mudemos de modelo.
Quando falamos de bicicletas, não estamos falando que vão substituir os ônibus, os trens nem nada disso. Mas as bicicletas podem chegar a ter uma porcentagem importante das viagens.
Hoje em São Paulo menos de 1% da viagens são feitas em bicicleta. Se chegarem a ser 10%, seria uma revolução. As ciclovias protegidas não são um detalhe arquitetônico simpático, mas um direito.
De novo, estamos falando de democracia. Quando um ônibus passa ao lado de carros engarrafados, temos um símbolo de democracia. O interesse coletivo está acima do particular.
[Bicicleta] não é uma pauta [de classe média]. Em Bogotá, os que mais usam são os mais pobres, que economizam: uma pessoa que ganha salário mínimo e consegue usar bicicleta economiza entre 15% e 20% de sua renda.
O aumento da passagem em SP foi o estopim das manifestações de massa de junho, e uma proposta central foi a gratuidade do transporte. O sr. acha viável?
É interessante que os protestos surjam ao redor da mobilidade porque a mobilidade é uma nova expressão de liberdade. Tem a ver com equidade. Mais importante do que a luta pela gratuidade agora é lutar por uma distribuição mais democrática do espaço viário, que dê mais e melhor espaço aos pedestres, mais corredores de ônibus, ciclovias protegidas. É a luta mais importante agora.
É importante subsidiar o transporte público, na melhor das hipóteses com recursos cobrados do uso do carro, porque quem mora mais longe do trabalho em geral é mais pobre. Mas transformar o transporte em totalmente grátis é muito difícil. Não conheço nenhuma parte do mundo em que isso tenha sido feito em larga escala.
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