sexta-feira, 20 de março de 2015

CICLISTAS 'ATROPELAM' PROMOTORA QUE INTERROMPEU CICLOVIAS

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A promotora de Justiça, Habitação e Urbanismo do Ministério Público de São Paulo, Camila Mansour Magalhães da Silveira, se reuniu com ciclistas e jornalistas para falar sobre a ação civil pública que pediu a paralisação da implementação de novas ciclovias na cidade de São Paulo; o debate esquentou e ela foi confrontada e até desmentida por eles; o relato foi publicado pelo Jornal GGN
20 DE MARÇO DE 2015
SP 247 - Os ciclistas da cidade de São Paulo estão revoltados com a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que determinou a paralisação total das obras das ciclovias e ciclofaixas da cidade, com exceção da Avenida Paulista. A decisão atende a um pedido do Ministério Público Estadual e a promotora de Justiça, Habitação e Urbanismo do órgão, Camila Mansour Magalhães da Silveira, conversou sobre a ação com eles e com jornalistas. Leia abaixo o relato da reunião publicado peloJornal GGN, do jornalista Luís Nassif. No encontro, ela foi confrontada e desmentida por eles.
Luiz Queiroz, Jornal GGN - Ontem, quinta-feira (19), a promotora de Justiça, Habitação e Urbanismo do Ministério Público de São Paulo, Camila Mansour Magalhães da Silveira, se reuniu com ciclistas e jornalistas para falar sobre a ação civil pública que pediu a paralisação da implementação de novas ciclovias na cidade de São Paulo. O debate esquentou e ela foi confrontada e até desmentida por eles.
O argumento principal da promotora, que ela repetiu inúmeras vezes ao longo da reunião, é que o Ministério Público não é contra a implantação das ciclofaixas e ciclovias, mas que precisa haver estudo de viabilidade e participação popular no planejamento.
No entanto, os ciclistas que estavam presentes fizeram a lição de casa, leram a ação e não hesitaram em apontar para a doutora as incoerências dos seus argumentos.
"O Ministério Público afirma que não é contra a implantação das ciclovias, mas a senhora cita aqui num trecho da ação que a bicicleta não é um meio de transporte em massa e que a eficiência é questionável porque a capacidade é ínfima. Não tem um juízo de valor nisso?", perguntou uma moça.
"Doutora, como fica a questão da segurança do ciclista nessa ação? Porque parece que vocês estão desconsiderando a existência de ciclistas na cidade de São Paulo", questionou um rapaz.
"Doutora, sobre a Avenida Paulista, no seu documento, em vários momentos, a senhora se coloca em defesa do ciclista, pela segurança dele. Eu como ciclista posso falar em nome de muitos, nós estranhamos isso. A Avenida Paulista é a avenida mais perigosa para os ciclistas, pensando na largura dela e na quantidade de ciclistas já mortos naquele local, nossos amigos que morreram nos últimos anos. Quando você diz que o transporte coletivo já é suficiente para atender aquela via, eu posso estender isso para os carros, por exemplo?", desafiou um terceiro e iniciou um debate, transcrito abaixo:
Promotora Camila Mansour Magalhães da Silveira – Eu não afirmo que é suficiente. Eu acho que o estudo é que vai indicar.
Participante da coletiva – A senhora colocou como argumentação...
Promotora – Sim, porque são meus argumentos fáticos para embasar o meu pedido.
Participante – Para voltar a Avenida Paulista ao formato original. Quer dizer, mantém o ciclista exposto...
Promotora – Sabe por quê? Porque a gente não tem ainda a certeza, como ele falou, já houve um gasto, e por conta da falta de participação popular, por conta da falta de planejamento urbano...
Participante – A senhora sabia que todo ano a Associação de Ciclistas de São Paulo faz uma contagem na Avenida Paulista para mostrar a demanda real que já existe ali?
Promotora – Então o senhor veja, pelo menos pra nós não foi encaminhado nenhuma estatística...
Participante – Mas a senhora dialogou com as associações?
Promotora – O senhor espera um minutinho. Não foi encaminhado nenhuma estatística de acidente envolvendo ciclista no município.
Participante – Mas é um dado que é publicado todo ano.
Promotora – Veja, tudo aquilo que teria embasado a implementação pelo Município, isso não veio. Não só em relação à Avenida Paulista. O que eu quero deixar claro é que eu não sou contra... o Ministério Público não está pedindo aqui que não implante, não é isso. A implantação tem que ser feita de forma que o administrador, utilizando a liberdade relativa, esse valor que a lei concede a ele, que ele faça a melhor opção, que ele prime pela eficiência.
Participante – Na sua ação, doutora, a senhora não questiona somente o método empregado pela Prefeitura, a senhora questiona a política pública em si. A senhora questiona a importância das bicicletas na cidade, a senhora advoga em favor do carro inúmeras vezes, dizendo que é o veículo que mais movimenta a economia e diz que é o principal veículo da cidade de São Paulo, de maior viagens, o que é um equívoco.
Promotora – Você está errado, o que se coloca aqui é que a política pública foi desprovida de estudo e de participação popular.
Participante – Desprovida? A gente consegue provar para a senhora que não foi desprovida. A gente, por exemplo, criou uma câmara temática de bicicletas para acompanhar a implementação com 20% da sociedade civil.
Promotora – Veja, o que se coloca aqui é que as oitivas têm que ser feitas não só com os ciclistas, mas com a população como um todo.
Participante – Isso é feito com o carro também? Obra viária é feito isso também? A senhora pede pra obra viária isso?
Nesse ponto a discussão aumenta, muitas pessoas começam a falar ao mesmo tempo, uma voz feminina, provavelmente uma assessora, corta o rapaz, diz que outras pessoas também têm que fazer perguntas, e a coletiva prossegue. A íntegra do debate está disponível aqui.
Mas esse trecho já ilustra bem as intenções da promotora e do Ministério Público Paulista. Desfazer o trabalho que foi feito até agora, e devolver os ciclistas à marginalidade, em favor da circulação dos carros e disponibilidade de vagas de estacionamento no viário urbano.
Sua tese está sim, cheia de juízo de valor, recheada de adjetivos e críticas à administração pública. Abaixo, alguns trechos da ação, que pode ser lida na íntegra aqui.
"Paralelamente ao desenvolvimento exacerbado do sistema cicloviário neste Município nos últimos meses, esta Promotoria de Justiça especializada recebeu e continua recebendo um número considerável de reclamações de munícipes sobre irregularidades e problemas que têm agravado o já caótico sistema de mobilidade urbana da Cidade de São Paulo".
"A implementação do sistema cicloviário nesta Cidade, da forma como está sendo realizada (sem prévio estudo técnico detalhado e sem participação popular), trará consideráveis prejuízos ao modal que ainda é o mais importante para a economia de São Paulo (registrando-se, mais uma vez, que o transporte público de massa é deficiente e, por ora, não há alternativa para esse modal)".
"Lamentavelmente, a Cidade de São Paulo, ao contrário do que ocorre em Nova Iorque e em Amsterdã, não possui um transporte público de excelência e, por ora, não há alternativa de transporte público coletivo. A bicicleta não é um meio de transporte de massa, de modo que sua eficiência é questionável, pois sua capacidade é ínfima".
"Infere-se, pois, que a implementação do sistema cicloviário no Município de São Paulo decorre, exclusivamente, da vontade política do administrador que, no caso em exame, não se coaduna com o interesse público".
"Não se concebe que a sorte das cidades fique a reboque da conveniência do administrador público", finaliza a peça.
Pois agora a sorte da cidade está a reboque da conveniência do judiciário. A implementação de novas ciclovias e ciclofaixas está suspensa por decisão do juiz Luiz Fernando Rodrigues Guerra, da 5ª Vara da Fazenda Pública, que aceitou parte dos argumentos da promotora.
A seguir, a Prefeitura vai enviar os estudos citados na ação para só então poder retomar os trabalhos.

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