O consumidor que ainda está em busca de passagens aéreas para curtir o fim de ano deve preparar — e muito — o bolso. Com a oferta de bilhetes restrita, sobretudo depois do fechamento da Webjet pela Gol, as empresas reajustaram os preços sem constrangimento.
Tanto que uma viagem de Brasília para Fortaleza ou Natal entre os dias 26 de dezembro e 2 de janeiro, trechos de ida e volta, pode passar de R$ 5 mil por passageiro, sem incluir as taxas aeroportuárias.
Os valores cobrados pela TAM e pela Azul nesses dois casos superam os bilhetes internacionais da capital federal para Londres e Paris, entre R$ 4,3 mil e R$ 4,7 mil, e são quase o dobro da média cobrada no trajeto para Buenos Aires.
Os valores levaram o governo a agir para evitar os abusos das empresas. Na avaliação de técnicos do Palácio do Planalto, a exclusão de um concorrente do mercado pela Gol é a senha que as companhias esperavam para punir os consumidores e tentar reverter rapidamente os prejuízos acumulados — somente no terceiro trimestre, as perdas das duas líderes do mercado passaram de R$ 1 bilhão.
Por determinação da presidente Dilma Rousseff, o ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Wagner Bittencourt, convocou, para hoje, uma reunião com o presidente da Gol, Paulo Sérgio Kakinoff, e o presidente de seu Conselho de Administração, Constantino de Oliveira Júnior. Na pauta do encontro, está o encerramento das operações da Webjet e os exageros nos valores da passagens. A reunião também terá a presença do presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Marcelo Guaranys.
Antes mesmo do anúncio do fim da Webjet, na última sexta-feira pela Gol, os preços das passagens já tinham decolado, conforme revelavam análises prévias. Ontem, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), pela Fundação de Pesquisas Econômicas (Fipe), que mede a inflação no município de São Paulo, apontou as tarifas das companhias aéreas como um dos cinco maiores destaques de alta nas últimas duas semanas. Elas subiram em média 7,98%.
O IPC ficou em 0,64%. Segundo o Sindicato Nacional dos Aeronautas, depois do anúncio do fechamento da Webjet, na sexta-feira, houve aumento de quase 300% em alguns trechos.
Belo Horizonte é a capital que registrou a maior elevação de preço de passagem aérea no acumulado dos últimos 12 meses (a partir de outubro) entre 11 cidades brasileiras. O aumento foi de 23,47%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em outubro, a alta foi de 15,52%, só perdendo para Goiana.
Alta temporada
Segundo o coordenador do levantamento da Fipe, Rafael Costa Lima, passagens aéreas e pacotes de viagem devem seguir pressionando a média geral de preços nos próximos meses, favorecidos pela própria alta temporada.
É consenso que as passagens tendem a ficar cada vez mais caras. “Com a chegada das festas de fim de ano, esses aumentos irão se refletir diretamente no bolso dos clientes do setor aéreo, que agora terão que avaliar muito bem a viabilidade da sua viagem”, afirmou a coordenadora institucional da Proteste, Maria Inês Dolci.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informa que o preço médio da tarifa de passagens aéreas nacionais recuou 43% de 2002 a 2011, quando a procura cresceu quase 200%. Mas admite que a tendência a partir deste semestre é bem diferente, puxada pela alta do dólar e pela disparada nos preços do querosene de aviação.
A Proteste lembra, porém, que, apesar de a Anac afirmar que houve queda no valor médio das passagens nos últimos anos, a redução da concorrência entre as companhias que se vê hoje é mais um fator a puxar as tarifas para cima.
As empresas líderes de mercado — Gol e TAM — são justamente as responsáveis por esse fenômeno. “A diferença de tarifas entre as duas empresas é quase inexistente, mas quando comparada com as outras menores, é quase o dobro. Nesse caso, todas tendem a reajustar os preços”, afirmou a coordenadora.
Segundo Maria Inês, a modificação generalizada nas tabelas, que vem sendo justificada pelas companhias com os aumentos nos preços dos combustíveis, é descolada do contexto econômico. “A alta nos últimos meses foi desproporcional se comparada à inflação, aos custos de operação e, sobretudo, ao aumento dos salários.
Esse resultado se choca bastante com a condição do consumidor de continuar viajando de avião”, observou. Procurada, a TAM informou que seus preços correspondem à demanda de cada cliente. Para isso, oferece a tarifa mais adequada para cada perfil: básico, flex e top. A Gol, a Azul e a Avianca foram procuradas e não se posicionaram a respeito dos preços das tarifas.
Para quem ainda deseja sair da sua cidade no fim de ano, Maria Inês recomenda que o consumidor pesquise muito antes de comprar, além de procurar sempre os próprios sites das empresas aéreas que não cobram taxas para efetuar as vendas.
Concentração
Para Alessandro Oliveira, professor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), as passagens só não alcançaram altitudes ainda maiores porque as líderes TAM e Gol não estão completamente sozinhas na briga pelos passageiros. “A absorção da Webjet fez o mercado avançar rumo à concentração, mas ainda não permitiu a volta do virtual duopólio de cinco anos atrás”, observa o economista. Segundo ele, união de Azul e Trip, juntamente com a Avianca, garantiu um patamar mínimo de concorrência.
“A terceira e quarta colocadas impedem o poder excessivo das duas primeiras e uma eventual combinação de preços e relaxamento no atendimento à crescente procura. Um equilíbrio maior do setor dependerá do apetite das competidoras médias para crescer”, explica Oliveira. Ele lembra que TAM e Gol já vinham perdendo participação, mesmo com as limitações técnicas e comerciais das outras.
André Castellini, da consultoria Bain & Company, acrescenta que o aumento das passagens é só um sintoma mais nítido da saída de cena da única companhia classificada no modelo de baixas tarifas (low cost, low fare), do qual a Gol fez parte nos seus primeiros anos.
Ele prevê mais cortes no total de voos para destinos comuns, com a continuidade da briga entre as duas gigantes do setor, donas de mais de 70% do mercado, a definir a tarifa média.
Convocação ministerial
O ministro do Trabalho, Brizola Neto, recebeu, ontem, representantes dos funcionários da Webjet. Eles pediram que o órgão interceda junto a Gol e reverta a decisão da empresa de demitir 850 pessoas, cortes que foram anunciados na sexta-feira passada.
Brizola Neto expressou preocupação com as demissões e se comprometeu em promover a mediação com a empresa para tentar cancelá-las. O ministro também conversará com integrantes do governo para buscar solucionar o problema. O ministério chamou a Gol para conversar.
Fonte: Correio Braziliense, Por Priscilla Oliveira, Sílvio Ribas e Geórgea Choucair