quinta-feira, 24 de abril de 2014

Salto de qualidade :: Delfim Netto

A extensão das concessões de rodovias para portos, energia e ferrovias gerará um aumento dramático da produtividade
Foto: Ricardo Giaviti/Flickr
Foto: Ricardo Giaviti/Flickr
A contribuição mais importante para melhorar a qualidade da gestão pública no Brasil nesses últimos 12 meses foi o sucesso dos leilões de concessão à iniciativa privada para construção e modernização de rodovias no interior do País, dando sequência à segunda etapa do Programa de Investimentos em logística – PIL, do governo federal. Ao todo, foram licitados trechos rodoviários somando 4,2 mil quilômetros, cujas pavimentação e/ou duplicação demandarão investimentos da ordem de 28 bilhões de reais, onde as faixas duplicadas devem ser concluídas nos primeiros cinco dos 30 anos de duração dos contratos.
As concessões arrematadas no último trimestre de 2013 incluem, em sua maioria, rodovias-tronco nas regiões de grande produção agrícola e da pecuária nos estados do Centro-Oeste que fazem a ligação com os portos do Sudeste, como as BRs 040, 050 e 060 em Goiás e Minas Gerais, e a BR-163, desde Sinop, no norte de Mato Grosso, a Itiquira, próximo à divisa de Mato Grosso, do Sul com São Paulo. São rotas de alto valor adicionado, com peso expressivo na economia, por onde passa o transporte de grãos da região que ostenta hoje os melhores índices de produtividade da soja, em nível mundial. O problema para o agricultor é que esse ganho de produtividade se perde durante o transporte.
Por causa do atual estado da malha rodoviária, transportar uma tonelada de soja de Mato Grosso ao Porto de Paranaguá custa o equivalente a 400 quilos do grão. Realizados os investimentos na infraestrutura, o custo cairá provavelmente para 200 quilos. O governo federal projeta entregar à administração privada quatro novos trechos com 2,6 mil quilômetros de rodovias, realizando leilões de concessão ainda no segundo semestre. Uma dessas licitações contempla o trecho da BR-163, desde Sinop, em direção ao Norte, para alcançar o Rio Tapajós na altura de Itaituba, de onde o transporte dos grãos seguirá por aquavia para exportação pelo Rio Amazonas.
De acordo com informação do jornal Valor Econômico em março, no suplemento especial sobre Logística (texto de Roberto Rockmann, à página 62), a previsão dos investimentos nas concessões rodoviárias da terceira etapa do PIL é de 17,8 bilhões de reais. Pelo novo formato que visa desburocratizar o processo dos leilões, a partir de propostas de manifestação de interesse, 21 empresas já se apresentaram para participar dos estudos sobre aquele trecho de 976 quilômetros da rodovia 163.
Num discurso recente, a presidenta Dilma Rousseff referiu-se ao resultado das licitações para as concessões na infraestrutura e afirmou que esse processo é fundamental para ajudar o Brasil a dar um salto de qualidade na gestão. O que a presidenta disse é absolutamente correto: o Brasil tem grande deficiência na qualidade da gestão, e uma das formas de melhorar isso é ampliando as concessões de infraestrutura. O governo entendeu que não poderia fixar todos os parâmetros das concessões e por isso devia estabelecer um e deixar que o mercado definisse outros, o que acabou acontecendo. Com o sucesso nas concessões das rodovias, ele se preparou para fazer a grande mudança: vêm aí as concessões nos portos, na energia, no sistema de transporte ferroviário, e é isso que vai fazer a diferença e permitir devolver ao Brasil as condições de acelerar o crescimento.
Apesar de que entre a realização dos leilões e o efetivo início da execução das obras sejam necessários alguns meses, haverá um efeito antecipado sobre o ânimo da sociedade, que começa a ver uma retomada dos investimentos na infraestrutura. O ambiente de negócios tende a melhorar, com a compreensão de que o setor privado não depende de benesses, mas sim de condições isonômicas para competir em leilões bem projetados para atender às carências atuais e sustentar os investimentos na qualidade dos serviços.
Não há no Brasil, hoje, disponibilidade de mão de obra. Temos uma situação muito próxima do pleno emprego, de forma que o crescimento tem de se realizar pelo aumento da produtividade da força de trabalho. Significa mais capital por unidade de mão de obra. O sucesso das concessões representa a transferência da gestão de um monopólio público para um monopólio privado, o que gera um aumento dramático da produtividade. É isso que faz a economia crescer.
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.
Fonte: Carta Capital

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