quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Metrô em São Paulo: Os sintomas do sucateamento


Panes no metrô paulistano: sintomas do sucateamento

Falhas no sistema vêm sendo mais constantes que no ano passado. Segundo Narciso Soares, do Sindicato de Metroviários de São Paulo, o processo de terceirização de serviços dos trens, a falta de investimento do governo estadual paulista na contratação de funcionários e manutenção e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) são fatores que contribuem para o que ele chama de “sucateamento do sistema de transporte público por parte das gestões tucanas”. A reportagem é de Isabel Harari e André Cristi.

Isabel Harari e André Cristi, na Carta Maior
São Paulo – Trens em velocidade reduzida ou parados por vários minutos entre uma estação e outra, aumento do tempo de espera nas plataformas, portas que não abrem. Em 2012, o paulistano vem sofrendo ainda mais com as constantes falhas no metrô de São Paulo. Entre janeiro e maio deste ano, por exemplo, foram canceladas 170% mais viagens programadas pelo sistema em relação ao mesmo período de 2011, segundo dados do Serviço de Informação ao Cidadão (SIC), disponibilizados no site do Metrô (Companhia do Metropolitano de São Paulo).
Na grande maioria dos casos, as falhas não são decorrentes de erros humanos e sim do próprio sistema metroferroviário – e impedem o “despacho”, ou seja, a partida dos trens. A consequência prática é o aumento do tempo de espera nas plataformas e a maior lotação dos vagões. De acordo com os dados do SIC – que constam de um relatório obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo em julho – o número de falhas entre janeiro e maio deste ano é ligeiramente maior do que o mesmo período do ano passado – 23 a 20 –, mas as ocorrências geraram mais do que o dobro de cancelamentos de saída de trens: 496 em 2012, 184 em 2011. Ou seja, as panes neste ano têm sido de mais gravidade.
Os problemas variam da não abertura das portas dos vagões ao choque de trens na Linha-3 Vermelha que ocorreu em maio deste ano, fruto de uma falha nos freios. Em 23 de agosto, por exemplo, por causa de um mau funcionamento no sistema de tração, as linhas 1, 2 e 3 circularam com velocidade reduzida. A situação restringiu a entrada de passageiros nos trens, superlotando as estações. O problema foi solucionado cerca de uma hora depois.
Segundo Narciso Soares, do Sindicato de Metroviários de São Paulo, o processo de terceirização de serviços dos trens, a falta de investimento do governo estadual na contratação de funcionários e manutenção e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) são fatores que contribuem para o que ele chama de “sucateamento do sistema de transporte público por parte das gestões tucanas”. O PSDB está à frente do estado desde 1994.
Em 2000, o metrô paulistano transportava cerca de 2,4 milhões de pessoas por dia; um ano depois, tinha em seus quadros 7.300 trabalhadores. Hoje, são 4 milhões de usuários, mas o número de funcionários aumentou para apenas 8.600 – além disso, sua extensão cresceu consideravelmente, com a inauguração de novos trechos e estações. Com o aumento da demanda, uma manutenção mais efetiva e mais recorrente é imprescindível para o bom funcionamento do sistema. No entanto, muitas das funções são terceirizadas, como a limpeza e o recolhimento de tarifas.
“Isso gera uma queda de qualidade, pois se deixa de lado todo o know-how dos metroviários e se contrata empresas que não têm nenhum conhecimento, que estão interessadas no lucro. Para elas, quanto menos gastos, melhor”, critica Narciso, funcionário do Metrô há oito anos.
Em São Paulo, a malha metroviária estende-se por 74 km, enquanto na Cidade do México são 201 km e em Nova York, 1.056 km. Entre 2003 e 2011 o governo do estado de São Paulo anunciou que investiria R$ 17,1 bilhões no metrô; no entanto, apenas R$ 9,8 bilhões, 57% do prometido, foram despendidos. O valor gasto em 2011 foi de R$ 1,3 bilhão, treze vezes mais que a cifra de 2003 (R$ 99,9 milhões), segundo notícia do portal Terra de maio deste ano.
Para o deputado estadual Simão Pedro (PT), o alto investimento nos trens, que deveria ser destinado a novas linhas e manutenção das demais, perde-se em meio aos desvios de verba, pagamentos de propina, obras superfaturadas e muitas vezes desnecessárias. “O Metrô sofre esses impactos em função de grandes desvios de dinheiro, que passa pelo pagamento de propina e serviços não realizados – as cláusulas estão ali para enganar. É o privado controlando e gerenciando um sistema altamente lucrativo”, denuncia.
A situação mais precária, porém, é a dos funcionários. “Hoje se faz muita hora-extra no Metrô, ninguém vive sem. Se todos os metroviários resolverem não fazer hora-extra durante dois dias, o Metrô para. Tem dinheiro, o problema é definir prioridades”, denuncia Altino de Melo Prazeres Júnior, presidente do Sindicato dos Metroviários de São Paulo. De acordo com ele, “falta dinheiro do governo – qualificação existe, mas faltam funcionários”. Já Narciso explica que não há resposta do governo em relação à contratação de novos funcionários. “A empresa [Metrô] coloca claramente que há um déficit de pessoas, mas não consegue contratar porque o governo não abre vagas.
”

Uma greve dos metroviários estava marcada para o dia 4, mas, atendendo a um pedido do TRT (Tribunal Regional do Trabalho), foi adiada para o dia 24, caso as negociações não avancem. Os trabalhadores reivindicam uma divisão mais justa da PR (Participação dos Resultados), que, segundo o sindicato, é destinada de forma desigual, beneficiando os funcionários de altos cargos, cujo salário líquido já é mais elevado. Em carta aberta à população, o sindicato também exige a melhora da jornada de trabalho e a equiparação dos salários.
“A população sofre a política do governo estadual, que privilegia os ricos. O sufoco do metrô lotado e a falta de investimento é um retrato da política do governador [Geraldo] Alckmin para os transportes públicos”, diz o texto.

A negligência do poder público em relação ao transporte coletivo também pode ser observada na esfera federal, com a falta de investimentos nas últimos gestões.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) destinou à área de transportes apenas 0,3% do PIB, enquanto no governo Lula (PT) o investimento foi de 0,4% – em ambos os casos, a prioridade foi o modal rodoviário, em detrimento do sistema metroferroviário. “A bandeira principal é pelo investimento de 2% do PIB nacional no transporte público”, defende Altino.
O presidente do Sindicato dos Metroviários de São Paulo critica ainda a diminuição do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) sobre a produção de automóveis determinada pelo governo federal nos últimos anos. Para ele, a medida contribuiu para o aumento da venda de veículos privados. “A grande medida hoje, para salvar a economia, é diminuir o IPI. Esse foi o grande investimento do Estado. Isso é uma transferência de dinheiro do Estado para a indústria privada. Mais uma vez se priorizou o transporte privado. Por que não se investiu esse dinheiro em construção de quilômetros de metrô?”, reclama.

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