quinta-feira, 4 de julho de 2013

Sem túnel, avançamos em direção das prioridades da cidade


Ontem o prefeito Fernando Haddad anunciou a suspensão da construção do túnel que ligaria a avenida Roberto Marinho à rodovia dos Imigrantes, previsto na operação urbana Água Espraiada. Sem dúvida o anúncio é muito positivo e sinaliza para uma mudança de prioridades em relação à mobilidade de São Paulo, especialmente neste momento em que a cidade coloca como urgente a necessidade da melhora na qualidade e acessibilidade do transporte público.
Como eu já havia afirmado antes aqui, independente de novas negociações com empresas de ônibus, a prefeitura já tem condição de tomar decisões que vão no sentido da ruptura com o modelo rodoviarista que privilegia o transporte individual por carro. A suspensão da construção desse túnel significa uma economia de cerca de R$ 2,4 bilhões, que poderão ser destinados a intervenções de maior interesse público.
Aliás, nas últimas décadas, a zona Sul, onde se situa a operação urbana Água Espraiada, recebeu uma série de obras viárias de grande porte, como o complexo de túneis Ayrton Senna, o túnel Sebastião Camargo, a ponte estaiada, as próprias avenidas Juscelino Kubitschek e Berrini, a extensão da Faria Lima, o alargamento da Roberto Marinho e sucessivas ampliações da marginal do Pinheiros… Além de serem prioridades discutíveis, considerando o conjunto da cidade, nada disso, obviamente, conseguiu resolver o problema do trânsito.
É importante lembrar que, até hoje, o modelo de operações urbanas implementadas em São Paulo dependeu da venda de cepacs (certificados de potencial adicional de construção) para se viabilizar. Isso produz uma lógica em que as prioridades de uso dos recursos acabam sendo orientadas mais para gerar valorização imobiliária – que se reflete nos preços desses títulos – do que para atender as demandas mais urgentes da cidade.
Até agora, no âmbito da operação urbana Água Espraiada, ações também previstas, como produção de habitação popular, por exemplo, estiveram longe de ser uma prioridade e demoraram para começar a ser implementadas. Essas ações representam uma parcela pequena do total de recursos investidos na operação. As obras viárias foram sempre priorizadas e consumiram a maior parte dos recursos angariados com a venda dos cepacs, como é o caso da ponte estaiada, onde ônibus, ciclistas e pedestres são proibidos de circular.
Além disso, é falacioso também o argumento de que estas obras não consumiriam recursos públicos – já que se trata de venda de cepacs obtidos no mercado. Na verdade, além do enorme investimento administrativo e de gestão para viabilizar estas operações, várias destas obras – como seria o caso do túnel – exigiriam uma complementação de recursos adicionais, para além dos já angariados via cepacs.
Esperamos que esta sinalização de mudança de prioridades da prefeitura, ao suspender a construção do túnel, venha no sentido de corrigir uma dívida histórica com a cidade com o sentido e o modo de implementação das operações urbanas, repensando-as para finalidades de interesse social, como transporte, áreas públicas e habitação de qualidade para a população de baixa renda.

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